terça-feira, 22 de março de 2016

Ricardo Bezerra O Compositor


Em nível mundial, o final dos Anos 60 foi um período de grandes transformações políticas e culturais. Uma verdadeira revolução no pensar e agir da juventude veio para transformar a sociedade como um todo. No bojo deste movimento mundial, surge, aqui no Ceará, um inquieto grupo de jovens estudantes universitários, atuando nos mais diversos campos das artes e da política. Eram seus "quartéis generais" o Bar do Anísio, o velho Estoril e o Centro Acadêmico da Escola de Arquitetura da UFC.  Dentre todos estes grupos, no entanto, foi o de música o que mais se destacou, principalmente através dos festivais e dos programas de TV da época. No meio dessa "turma" estava Ricardo Bezerra, estudante de Arquitetura, vindo, pelo lado materno, de uma família de Aracati, terra de reconhecida musicalidade. Da convivência entre esse grupo de jovens, surgem então, as mais diversas parcerias musicais, algumas que são, hoje, clássicos da música brasileira. Tendo composto, em parceria, com poetas e compositores do calibre de Brandão, Mino, Fausto Nilo, Augusto Pontes, Yeda Estergilda, Rodger Rogério e Petrúcio Maia... é no entanto com Raimundo Fagner que o trabalho musical de Ricardo Bezerra se consolida em composições, hoje antológicas, dentre as quais se destacam Cavalo-Ferro, Manera Frufru Manera e Sina, esta última em parceria com o renomado poeta popular Patativa do Assaré. No momento da decisão de dedicar a carreira profissional à música, o que significava, na época, a mudança para o eixo Rio-São Paulo, Ricardo Bezerra opta pelo estudo da arquitetura e urbanismo e permanece em Fortaleza, continuando seu trabalho musical nessa cidade, procurando incentivar os novos valores musicais que vinham surgindo no rastro do grupo inicial. Entre estes se destacaram Amelinha, os irmãos Gracho e Caio Silvio e Francisco Casaverde.
Em 1972 se casa (com a jornalista Bete Dias), mora durante um ano em Recife, trabalhando como diretor de criação de uma agência de publicidade, oportunidade em que se relaciona com um variado grupo de artistas e intelectuais pernambucanos onde se destacavam Alceu Valença, Geraldinho Azevedo, Thiago Amorim, Zé Ramalho, Cavani Rosas, Ricardo Noblat, Ivan Maurício e Tadeu Lubambo entre outros.
Em 1974 retorna a Fortaleza e passa a morar, com a família, na Maraponga, num sítio à beira da lagoa, local que se torna ponto de referência para o pessoal da música e das artes em geral. Nessa época Fagner passa a morar com a família e reforça ainda mais a convergência do local para os artistas da terra e de fora. Foram hóspedes na Maraponga, no começo de suas carreiras, figuras do calibre de Gonzaguinha, Antônio Adolfo, Alceu Valença e muitos outros que por lá passaram.
Em 1977, Ricardo Bezerra resolve voltar à música como profissional e a partir de convite do Fagner, se muda para o Rio com a finalidade de gravar um LP com a produção esmerada deste amigo e parceiro para a então CBS. Mais uma vez, sentindo que o mundo da música popular, o chamado show business, não era sua verdadeira vocação, RB retorna a Fortaleza e resolve dedicar-se ao ensino de arquitetura, sendo então admitido como professor na UFC. Sua música, no entanto, continuou nascendo em esparsas mas significativas composições feitas em parceria com amigos. Enquanto isso tem músicas gravadas pelo Quarteto em Cy, Nara Leão, Ney Matogrosso, Vange Milliet e Pessoal do Ceará (Ednardo, Ródger e Teti). Nos meados dos anos 80, parte com a família (agora mulher e três filhos) para o Arizona, onde faz um mestrado em paisagismo. No início dos anos 90, continuando sua formação acadêmica, parte para a Inglaterra a fim de obter um doutorado em urbanismo. É durante a fase de redigir seu trabalho que ressurge a música e uma série de composições nasce das entrelinhas da sua tese que versa sobre habitação popular em Fortaleza. São estas composições, somadas a algumas que haviam ficado esquecidas no passado que Ricardo Bezerra compõe este novo disco, feito mais de 20 anos após o primeiro. Neste trabalho estritamente instrumental, com produção executiva de Henilton Menezes, as palavras estão traduzidas em notas musicais, regiamente arranjadas por Adelson Viana, Cristiano Pinho e Ricardo Bacelar, compondo um conjunto harmônico de músicas de qualidade. Esse novo disco recebeu o apoio da Secretaria de Cultura e Desporto do Estado do Ceará, mediante o uso dos incentivos fiscais oferecidos pela Lei Estadual de Incentivo à Cultura (Lei Jereissati).

Histórico da atividade musical de Ricardo Bezerra
1967 - Participa dos festivais locais promovidos por entidades universitárias.
1968 - Participa do Festival de Música Aqui no Canto, promovido pela Rádio Assunção, dirigido por Aderbal Freire Filho, Augusto Pontes e Mércia Pinto. Classifica três entre as doze músicas selecionadas para a final. Do festival é produzido um disco independente, hoje uma raridade no meio fonográfico. Conhece os principais compositores da "nova geração" e começa uma série de parcerias principalmente com Raimundo Fagner e Brandão.
1969-70 - Trabalha na produção dos programas de TV Gente que a gente gosta e Porque hoje é Sábado, dirigidos e apresentados por Gonzaga Vasconcelos, onde se apresenta, principalmente, em dupla com Fagner.
1974 - Participa em Olinda, Pernambuco, do show 7 Cantos do Norte, produzido por Thiago Amorim, ao lado dos principais compositores da nova música nordestina: Alceu Valença, Fagner, Geraldinho Azevedo, grupo Ave Sangria e Robertinho de Recife, entre outros.
1975 - Realiza o show "Aves do Céu" com os "novíssimos" compositores cearenses Caio e Gracho Silvio, Ferreirinha (Francisco Casaverde), Tarcísio Lopes, Célio Loureiro, ainda com a participação especial de Petrúcio Maia, no Teatro do Ibeu.
1977 - Grava o LP Maraponga, produzido por Raimundo Fagner, com arranjos do Hermeto Paschoal e participação especial da Amelinha e do próprio Fagner. Participam, também como músicos, do disco, Sivuca, Jacques Morelembaum, Mauro Senise, Robertinho de Recife e Nivaldo Ornelas, entre outros.Acompanha o Fagner, como tecladista, em shows no Rio e São Paulo.
1978 - Lança o disco Maraponga no Teatro José de Alencar, acompanhado dos artistas Ângela Linhares, Tarcísio Lopes, Descartes Gadelha, Cláudio Castro e Lázaro Medeiros, entre outros, com cenário do artista plástico José Tarcísio e produção do jornalista Neno Cavalcante. Cria e desenvolve o Relógio dos Tons, instrumento para estudo de harmonia musical.
1979 - Desenvolve parceria com Ângela Linhares. Apresenta o Relógio dos Tons na Sala Interarte da Cultura Alemã da UFC, em evento organizado pelo artista multi-mídia Bené Fonteles.Participa do projeto Soro, que reúne, nesta geração, pela primeira vez, música, poesia, canto e artes plásticas.Entra em "recesso musical". Dedica-se a trabalhos acadêmicos no âmbito da UFC, principalmente na área da extensão universitária.
1997 - Retoma os trabalhos musicais, fazendo novas composições. Recebe convite de Maninha Morais, diretora do Theatro José de Alencar para apresentar-se no Projeto Solos Brasileiros. É então acompanhado pelos músicos Heriberto Porto, Carlinhos Ferreira, Newton Fiori e Alex Holanda.A partir de convite dos jornalistas Nelson Augusto e Flávio Paiva, participa do Projeto Sexta com Arte promovido pelo Sindicato dos Jornalistas. Faz sua apresentação com a participação especial de Manassés de Souza e Chico Pio.
2001 - Inicia gravação de CD, com o trabalho das composições produzidas nos últimos anos, com arranjos de Adelson Viana, Cristiano Pinho e Ricardo Bacelar e produção executiva de Henilton Menezes.
2003 - Lança o CD "Notas de Viagens" por ocasião da inauguração da Livraria OBOÉ, em Fortaleza.
Fonte: nelsons 
Conhecido como letrista no contexto do Pessoal do Ceará, Ricardo Bezerra promete compartilhar composições instrumentais - e boas histórias - no X Festival Jazz & BluesMontado num cavalo-ferro, Ricardo Bezerra via sua poesia ecoar pelo Brasil, quando a geração que viria a ser conhecida como ´Pessoal do Ceará´ recolocou a produção musical cearense no mapa, na década de 70. Presente no disco ´Meu Corpo, Minha Embalagem, Todo Gasto na Viagem´, compartilhado por Ednardo, Téti e Rodger Rogério, ´Cavalo-ferro´ exemplificou a parceria entre Ricardo e Raimundo Fagner, estampada também no título do LP de estréia do cantor, ´Manera Fru Fru Manera´.Apesar desses êxitos que o tempo não cuida de superar, Ricardo Bezerra faz questão de relativizar seus méritos como letrista, destacando a própria inclinação para a música, mesmo sem pretensões de virtuosismo. ´Na verdade, essa minha fase de letrista foi um acidente de percurso, porque o Fagner não se dedicava a isso, e eu assumi na nossa parceria, na época´, delimita. ´Mas até hoje ainda tô pra entender como consegui fazer a letra de ´Cavalo ferro´, de ´Manera Fru Fr u´. Acho que só a idade mesmo, né? A gente é afoito, se mete e faz. Ali naqueles dois casos deu certo, mas foi graças às músicas que o Fagner botou ali´, credita, humildemente omitindo a própria desenvoltura na melodia de canções como ´Sina´, creditada a ele, Fagner e ao autor dos versos: Patativa do Assaré. Outro clássico da música feita no Ceará.´Meu lado mesmo sempre foi a música. Toco piano desde muito novo. Estudei com a Dona Vanda e com o Orlando Leite, em uma pequena formação, de dois, três anos, mas que deu uma base muito forte´, rememora. ´E aí nunca mais deixei. Não tem como deixar a música. É uma coisa visceral´.Passadas mais de três décadas desde sua própria estréia em disco solo (com o LP ´Maraponga´, de 1978), Ricardo se prepara agora para encarar um novo desafio: uma apresentação no X Festival Jazz & Blues de Guaramiranga. Na segunda-feira de carnaval, o piano Steinway que deve subir a serra será o veículo para o compositor compartilhar histórias e criações com o público - privilegiando temas mais recentes e falando de seu processo criativo, muitas vezes marcado pela ludicidade.´Tive experiências como a da ´Trilogia do Sonho´, de fazer umas músicas sonhando... É um barato´, aponta. ´Outras músicas ficam sem nome, levam o nome da hora em que foram feitas. ´Domingo de manhã´, ´Quinta de noite´...´, enumera. ´Uma eu fiz e tinha certeza que era uma música que já existia, um plágio. Mostrei a vários amigos, a outros músicos, e todo mundo me dizia que não, que era uma música nova. Aí acabei deixando o ´plágio´ no nome. Ficou ´Plágio em bolero´, embora nem seja mais um bolero´, ri-se.
Outra dessa nova safra é ´Carnaval da Aurora´, uma marchinha que surgiu de estalo, ao ouvir em um programa de rádio a produtora cultural Aurora Miranda Leão. ´Veio a idéia de uma marchinha, porque ela estava falando em um festival de marchas. Chamei outras pessoas pra fazer junto, mas acabei fazendo sozinho mesmo. Se houver clima, encerro o show em Guaramiranga com essa música, aproveitando que vai ser carnaval´.
Recital Solo
Mesmo ressaltando as próprias limitações como instrumentista - ´Assim como tem jornalista e jornaleiro, costumo dizer que eu sou um pianeiro´ -, Ricardo Bezerra optou por uma corajosa apresentação solo, diante do convite para participar do festival. ´O pessoal da Via (de Comunicação, empresa responsável pelo evento) me mandou um e-mail pedindo o nome dos músicos que iam tocar comigo. E eu respondi: ´Os músicos são só eu mesmo´´, conta. ´Aí a Rachel (Gadelha, produtora) me mandou um e-mail: ´Ricardo, tenha cuidado...´. Aconselhou a chamar alguns músicos experientes, pra tocar. E ela tem toda razão. Mas eu disse: ´Tenha fé, que vai dar certo´´.Curiosamente, a decisão pelo formato minimalista sucedeu uma idéia inicial de proporções grandiosas. ´Tinha pensado, no começo, em fazer uma opereta a partir do ´Manera Fru Fru´, expandindo a música, trabalhando cada parte dela, chamando vários músicos, contando com vozes femininas, com percussões... É um projeto antigo que eu tenho´, revela Ricardo. ´Mas aí o tempo de preparação foi pouco. O Adelson (Viana, acordeonista e pianista), que eu ia chamar pra fazer comigo esse projeto, estava muito ocupado, vai tocar com o Dominguinhos no festival... Aí pensei bem: vou fazer isso é solo´, reconstitui. ´Porque aí me responsabilizo pelos meus atos. Não boto ninguém no fogo. E fico mais livre pra fazer o que é o jazz, que é criar na hora, poder viajar em cima de coisas no momento, seguir aonde o clima levar´.
Chance também para compartilhar histórias com o público. ´Começo com uma nota de esclarecimento, deixando bem claro tudo isso. E gosto de falar, contar casos, situações. De modo que as pessoas possam dizer depois do show: ´Esse cara não toca nada, mas até que conta umas historinhas engraçadas´´. Ricardo com a palavra.
De ´Maraponga´ a ´Notas de Viagens´
Com uma trajetória profissional na Arquitetura, Ricardo Bezerra foi um dos compositores de destaque na geração do Pessoal do Ceará. Entre outras de suas parcerias estão ´Postal de amor´ (com Fagner e Fausto Nilo) e ´A Nova Conquista´ (com Fagner). Em 1978 lançou o disco ´Maraponga´ e em 2002 apresentou ´Notas de Viagens´, trabalho instrumental essencialmente autoral, compartilhado com músicos como Adelson Viana, Cristiano Pinho e Italo Almeida. Segundo Ricardo, as composições mais recentes, que terão destaque em seu show no Festival Jazz & Blues de Guaramiranga, formarão a base de seu próximo disco. ´São baladas, em sua maioria, outras com aquela força do tango. Algumas coisas têm aquela característica de trilha, aquele clima sonoro. E tem também alguns baiões, embora muito disfarçados, que só percebo como baiões algum tempo depois que fiz. Mas são músicas que eu gosto de fazer, porque me sinto mais próximo do Nordeste´, detalha. ´No show vou tocar também ´Gitana´, do ´Maraponga´, e umas duas ou três músicas do ´Notas de viagens´´.

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